quarta-feira, 4 de março de 2009

Barragens


Linda foto, não ?

Pois esta cachoeira, e junto com ela um sítio arqueológico na região de São Geraldo do Araguaia podem sumir debaixo de uma nova usina hidroelétrica, a de Santa Isabel, que está em estudos para ser erguida entre Ananás, no Tocantins, e São Geraldo, no Pará.
Existem hoje no Estado do Pará estudos sendo feitos para a construção de diversas novas usinas hidrelétricas, além da de Belo Monte, na curva grande do rio Xingu, e, segundo algumas reportagens, talvez 80 só no eixo Araguaia-tocantins, entre as quais as UHE Marabá, em estudos no rio Itacaiúnas, município do mesmo nome, e a já citada UHE Santa Isabel.
A barragem da hidroelétrica de Marabá pode deixar debaixo d’água parte da Terra Indígena (TI) Mãe Maria, da etnia Gavião. A área a ser inundada é a mesma de onde esta enia retira as pedras para as pontas de suas flexas, privando assim a comunidade de mais uma parte de sua tradição e história.
Outros projetos falam na construção de duas PCHs(pequenas centrais hidroelétricas), localizadas no rio Curuá, bacia hidrográfica do rio Amazonas, no município de Novo Progresso –as usinas de Salto Buriti e Salto Curuá.
Além destas, as UHE’s de Tabajara, cinco no rio Teles Pires, que atravessa o Matogrosso e o Pará, chegando até Itaituba e considerado um verdadeiro paraiso pelos pescadores esportivos, as de Apiacás, São Luiz, São João da Barra, Cachoeira Porteira (localizada na margem esquerda do rio Trombetas) e Prainha estão com estudos em andamento ou projetados para os anos de 2009 e 2010.
Os impactos de tais obras são muitos, e afetam o ambiente e as populações das áreas inundadas, podendo levar a diminuição da quantidade e da diversidade de peixes, impedindo o fluxo gênico das espécies e até sua reprodução (piracema), alagando terras férteis, gerando desmatamentos e podendo levar a contaminação de rios, com as alterações feitas no leito do rio e o aporte de matéria orgânica da floresta (folhas, troncos e galhos) podendo causar eutrofização (aumento da quantidade de matéria orgânica em um ecossistema, consumindo assim o oxigênio da água e levando a mortandade de organismos aquáticos).
Os impactos na fauna da área não são resolvidos com os famosos resgates, operações muitas vezes pirotécnicas e que somente adiam a morte dos animais, muitas vezes sendo para a espécie mais lucrativo que os espécimes da área alagada tivessem morrido afogados, pois serão soltos em áreas já ocupadas por outras populações da mesma espécie, que passarão a competir por alimento e hábitat, podendo levar a morte de ambas as populações.
No campo social a criação de novas barragens significa mais excluidos, populações tradicionais e campesinos que terão que começar tudo do zero, em áreas estranhas e muitas (quase todas as) vezes privados de vinculos familiares e comunitários, pois os deslocamentos dificilmente levam em conta parentesco e laços de amizade na hora de reassentar as famílias, dificultando ainda mais fixação destas em um local estranho.
Pequenos produtores rurais e populações tradicionais não são como moradores urbanos, que compram tudo no mercado. Necessitam de plantações e animais de produção ou silvestres para alimentação, que não terão no local de assentamento, pois terão que iniciar do zero as lavouras, criações e plantações de fruteiras e especies de uso tradicional, sejam medicinais, sejam de uso religioso ou mistico, caso de muitas populações tradicionais e também indigenas.
Essas pessoas, ao enfrentarem todo tipo de dificuldade por ocasião dos deslocamentos, e sem vinculo nenhum com o novo local de morada, tendem a engrossar os cinturões de pobreza das grandes cidades, criando ainda mais caos urbano no pais.
Isso tudo sem levar em conta as tradicionais “falhas” nos EIA-RIMA, que esquecem as populações de indígenas e quilombolas, espécies ameaçadas e, às vezes, como foi um caso não tão recente (mais ou menos 2 anos) não vêem ecossistemas inteiros, pois no sul do país, uma barragem que não recordo o nome, alagou centenas de hectares de florestas de araucárias, citadas no eia-rima como áreas já alteradas. Ao ser descoberto o embuste, a justiça determinou que fosse permitido o fechamento da barragem, pois já havia sido aplicado muito din-din público na obra.
Isso tudo, leitores, sabendo que as usinas de Tucuruí e Curuá-Una suprem segundo dados disponíveis no site da Eletronorte, 99,00 % da energia do Estado do Pará, e que tais empreendimentos pouco ou nada trazem de retorno social, pois o IDH das populações na área do empreendimento não melhora de maneira significativa, e a energia gerada será toda dirigida a indústrias eletro- intensivas, com metalurgia e siderurgia, voltadas para exportação de bens primários, ficando o Estado como ônus das migrações e o prejuízo ambiental, que não é pouco, e recebendo quase nada em troca.
Vale a pena tal esforço pelo “progresso”? Essa será nossa única porta de entrada no rol dos países ditos ricos?
Devemos refletir sobre isso, e nos governantes que acreditam em tal profecia para que no futuro próximo não fiquemos somente com lagos e buracos, e nosso povo cada vez mais empobrecido.
Foto de Fernanda Cunha, cachoeira das Três Quedas.

Nenhum comentário: